sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Do editor para o leitor

Da redação
Na noite fria, a paisagem da neblina, o ruído quase imperceptível e duas crianças travam uma batalha remexendo no lixo que já fora algumas vezes revirado naquela madrugada. Sempre um integrante deste exército de desvalidos encontra algo e, por desventura, se alimenta destas sobras em sua faina diuturna em busca da sobrevivência. Esta cena vimos em Uruguaiana, numa madrugada de julho, onde testemunhamos este labor, nas horas vazias desprovidas de luz, esperança e comunhão. Lembremos da máxima de que lugar de criança é na escola. Todavia, na escola da vida, do sacrifício e do infortúnio, elas perambulam pelas ruas, avenidas e becos da cidade em busca de comida ou algo que possa ser convertido em moeda nas milhares de lixeiras espalhadas pelo perímetro urbano, disputando espaço com os cães e gatos abandonados. Lembremos do poema O Bicho de Manuel Bandeira, o poeta da ternura, escrito em 27 de dezembro de 1947, portanto, há 60 anos e tão atual. Nele lemos: "Vi ontem um bicho/ Na imundície do pátio/Catando comida entre os detritos./ Quando achava alguma coisa,/ Não examinava nem cheirava:/ Engolia com voracidade./ O bicho não era um cão,/ Não era um gato,/ Não era um rato./ O bicho, meu Deus, era um homem". Hoje, na nossa cidade, mais de 5 mil pessoas sobrevivem catando lixo, reciclando e varando noites com suas carrocinhas e bicicletas, provendo seu sustento. Finalizando, resta aos conscientes, a indignação, o asco e a denúncia contra esta rede miserável que se perpetua e nos entristece, frente a insensibilidade, inércia e o desleixo de uma sociedade cega e surda aos apelos de seus filhos. Neste quadro, soa em nossos ouvidos a música de Sérgio Rojas quando, em silêncio e oração, repetimos: Senhora Sant'Ana proteja e ilumine nossa Uruguaiana e sua gente.

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